Festival de Dança de Londrina 2023

Arte e educação bailam juntas no Festival de Dança de Londrina

Com o tema “sentir e inventar sentidos”, evento anuncia espetáculos nacionais e internacionais e abre bilheteria on-line. Programação acontece de 7 a 15 de outubro
Foto: Ledores no Breu / Alécio Cesar

No cartaz do Festival de Dança de Londrina 2023, temos uma ilusão de ótica. Aparentemente, um dente-de-leão espalha suas sementes ao vento, mas, quando fixamos o olhar, reparamos que é o tutu de uma bailarina clássica que se expande. A lufada que enche o quadro de movimento e eriça a textura de pele ao fundo da imagem é o prenúncio da necessidade de “sentir e inventar sentidos” em uma sociedade anestesiada. Um dos eventos mais aguardados da agenda cultural de Londrina, o Festival de Dança começa no próximo sábado, dia 7, e estende-se até o dia 15, com uma curadoria que evoca reflexões sobre como as artes da presença podem contribuir para resgatar os valores da vida e as sensações do corpo, oferecendo caminhos possíveis para uma educação centrada no humanismo e no respeito à alteridade. O tema surge, segundo a organização, dos episódios de violência e evasão na escola, no pós-pandemia, e das preocupantes transformações que as matrizes curriculares vêm sofrendo no Paraná.

Ao todo serão dez espetáculos nos palcos do Teatro Ouro Verde e Divisão de Artes Cênicas da Casa de Cultura da UEL, trazendo à cidade, mais uma vez, nomes consagrados do cenário nacional e internacional da dança e do teatro, que se apresentam ao lado de talentos locais. “Este ano, em razão da queda do nosso orçamento, optamos por centrar a programação no essencial: organizar poucos espetáculos, mas todos de grande qualidade estética e técnica. São montagens com reflexões profundas e verticais sobre os temas que escolhemos tratar, para o público não perder nenhum”, destaca a coordenadora geral Danieli Pereira, que divide a curadoria com Renato Forin Jr.

Houve uma queda de três vezes o orçamento da edição passada, o que justifica a ausência da tradicional grade de oficinas. Entretanto, o evento persiste em sua política de democratização de acesso aos espetáculos, com gratuidade na abertura e ingressos a preços populares: R$20 e R$10 (meia-entrada) nas demais apresentações. Os bilhetes já podem ser adquiridos pelo Sympla, com acesso pela página oficial do Festival.

Antonio Nóbrega na abertura

Logo na primeira noite, dia 7, o Festival de Dança convida o público a celebrar a riqueza da cultura popular brasileira com a especial presença dos mestres Antonio Nóbrega e Rosane Almeida, entusiastas das práticas lúdicas na transmissão de saberes. Eles apresentam, após a cerimônia de abertura, às 20 horas, no Teatro Ouro Verde, o espetáculo “Mestiço Florilégio”. A montagem é uma rica costura de canções, momentos teatrais e peças coreográficas desta versátil dupla de artistas, em fusão cenográfica com imagens projetadas, principalmente do filme “Brincante”. Em 2023, Nóbrega completa cinquenta e um anos de carreira e quarenta de atuação em cena junto a Rosane. A entrada é gratuita, com direito à retirada de dois ingressos por pessoa, via Sympla.

Nas noites seguintes, o tema central do Festival estará também em espetáculos como “Memória de Brinquedo”, apresentado pela Curitiba Cia. de Dança. A montagem nos lembra que a infância é uma das mais importantes fases da educação e da formação do indivíduo, capaz de criar rastros que ficam por toda a vida. Coreografado por Luiz Fernando Bongiovanni, o espetáculo chama a atenção para os efeitos do excesso de tecnologia no mundo em que vivemos e para a importância de unirmos esforços para resguardar a atividade do brincar. O programa da Curitiba Cia. de Dança inclui ainda a suíte do balé de repertório “Dom Quixote”, uma ode à imaginação baseada na obra de Miguel de Cervantes. A versão tem direção geral de Nicole Vanoni, além de ensaio e coordenação de cena assinados por Ana Botafogo.

Já a Cia. do Tijolo, de São Paulo, leva ao palco da Divisão de Artes Cênicas da Casa de Cultura da UEL o espetáculo teatral “Ledores no Breu”, uma emocionante reflexão sobre o poder transformador da educação, aquela que ensina não apenas a decifrar os códigos do alfabeto, mas também a ler o mundo. A montagem, baseada no texto “Confissão de Caboclo”, do poeta paraibano Zé da Luz, e no pensamento e prática do educador Paulo Freire, adverte para as consequências do analfabetismo, inclusive o funcional. A direção é de Rodrigo Mercadante, também responsável pela dramaturgia, ao lado de Dinho Lima Flor.

Gargalhadas para fazer pensar

A aceitação do “diferente”, desafio que deve ser enfrentado diariamente por educadores e pais, será abordada por três cativantes bailarinas da Grita Cia. de Palhaças, de Londrina, em espetáculo apresentado na véspera do Dia das Crianças. “As Multidançarinas” apresenta ao público Adelaide, Cora e Frida, que devem arrancar gargalhadas de todos enquanto mostram, com suas excentricidades, que a dança é para todos que querem dançar. A montagem tem direção do também palhaço Gerson Bernardes.

Ainda com os olhos voltados para as relações entre arte e educação, o Festival de Dança de Londrina relembra a trajetória da bailarina Carina Corte, que dedicou grande parte de sua vida a um dos mais respeitados projetos socioeducativos desenvolvidos na cidade, o Faces de Londrina, que, por 13 anos, levou dança a milhares de crianças e adolescentes de bairros periféricos, transformando suas trajetórias pessoais e profissionais. A montagem “A Bênção do Grande Urubu” mescla diferentes linguagens artísticas (fílmica, literária e cênica) e nasceu da percepção do bailarino Aguinaldo de Souza, do artista visual Maurício de Oliveira, da atriz Michelle Florêncio e do jornalista e produtor cultural Álvaro Canholi da importância de resgatar o trabalho de Carina após sua prematura morte, em 2021.

Como se tornou tradicional, o Festival realiza ainda a mostra local “Dança Londrina”, noite em que artistas da cidade desfilam pelo palco do Teatro Ouro Verde números de até cinco minutos ligados aos mais variados estilos: do street dance ao balé clássico, do contemporâneo às danças tradicionais, do jazz às modalidades de salão. A noite é um espaço aberto, via inscrição que segue aberta até a próxima sexta (dia 6), para que bailarinos independentes, grupos amadores, escolas de dança e projetos socioeducativos exibam suas produções e celebrem as origens do evento, que começou, há vinte anos, como “Tardes de Dança” e “Mostra Estímulo”.

Sobrevivemos. E agora?

O Ballet de Londrina, companhia anfitriã do Festival, estreia na cidade o programa “Humana Natureza”, composto por duas coreografias assinadas por Henrique Rodovalho. Ambas remetem à trajetória da raça humana sobre o planeta, desde a origem da vida a partir dos elementos naturais até a entrada na civilização e o salto para a virtualidade. O programa é composto por “Cinco”, que fez première de sucesso no Sesc Vila Mariana, em São Paulo, no mês de julho, e “Bora!”, empolgante coreografia que tem sido dos maiores sucessos recentes da companhia em suas últimas circulações. De 2022, esta nasceu das investigações de Rodovalho sobre as líquidas e instáveis relações humanas no nosso tempo, marcadas pela pós-pandemia.

Aliás, o enclausuramento causado pela Covid-19, seus reflexos nas relações humanas e a necessidade de um “respiro em meio ao caos” também inspiraram outros dois trabalhos que integram a programação de 2023. Um deles é “Mercúrio”, com os bailarinos Luiz Oliveira e Irupé Sarmiento, de São Paulo. A montagem, idealizada por Oliveira e também coreografada por Rodovalho, parte do texto “Fevereiro”, da poeta portuguesa Matilde Campilho, que é entoado em sua voz na trilha. Em meio à pandemia, o poema ecoou como um convite a um mergulho no amor entre duas pessoas – este contraditório sentimento que cabe em “cinco mil explicações”, como destaca a escritora. E tal qual o amor, a coreografia de “Mercúrio” busca um lugar entre o gesto e o movimento, a dança e as suas inúmeras formas de se multiplicar.

A outra montagem resultante das transformações sociais deste evento histórico é a que encerra a programação do Festival, no dia 15. “T para T”, da célebre Brenda Angiel Cia. de Danza Aérea, da Argentina, faz literalmente o mundo virar de ponta cabeça. Seus intérpretes foram afetados de diferentes maneiras em relação a questões como gênero, luto e identidade. O resultado em cena expõe as dinâmicas de dois indivíduos que habitam espaços inimagináveis e irreais, levando também o público a um ponto de vista não-convencional. O trabalho coreográfico foi desenvolvido pela argentina Brenda Angiel, uma das pioneiras da dança aérea na América Latina, em fusão com a dança contemporânea.

O Festival de Dança de Londrina 2023 é uma realização da APD (Associação dos Profissionais de Dança de Londrina e Região Norte do Paraná) e tem patrocínio da Prefeitura Municipal de Londrina / Secretaria Municipal de Cultura, por meio do PROMIC (Programa Municipal de Incentivo à Cultura), com apoio institucional da Casa de Cultura da Universidade Estadual de Londrina (UEL) e apoio cultural da Rádio UEL FM.

Serviço:
“Mestiço Florilégio” – Antonio Nóbrega e Rosane Almeida (São Paulo – SP) – dia 07/10 – Teatro Ouro Verde (GRATUITO)
“Mercúrio” – Luiz Oliveira e Irupé Sarmiento (São Paulo – SP) – dia 08/10 – Teatro Ouro Verde
Mostra Local “Dança Londrina”- Grupos e artistas de Londrina e região (Londrina – PR) – dia 09/10 – Teatro Ouro Verde
“Memória de Brinquedo” e “Dom Quixote” (suíte) – Curitiba Cia. de Dança (Curitiba – PR) – dia 10/10 – Teatro Ouro Verde
“As Multidançarinas” – Grita Cia. de Palhaças (Londrina – PR) – dia 11/10 – Teatro Ouro Verde
“A Bênção do Grande Urubu” – Homenagem a Carina Corte (Londrina – PR) – dia 12/10 – Teatro Ouro Verde
“Ledores no Breu” – Cia. do Tijolo (São Paulo – SP) – dia 13/10 – Divisão de Artes Cênicas – Casa de Cultura da UEL
“Humana Natureza” (Cinco e Bora!) – Ballet de Londrina (Londrina – PR) – dia 14/10 – Teatro Ouro Verde
“T para T” – Brenda Angiel Cia. de Danza Aérea (Buenos Aires – Argentina) – dia 15/10 – Teatro Ouro Verde

Os ingressos para os espetáculos do Festival podem ser adquiridos na plataforma Sympla (sympla.com.br/festivaldedancadelondrina) a R$20 e R$10 (meia-entrada). A partir do dia 7, a bilheteria física também funcionará no Teatro Ouro Verde, diariamente, com abertura às 16 horas. A grade de programação pode ser acessada no site oficial do evento: www.festivaldedancadelondrina.art.br. Informações em tempo real e outras curiosidades sobre as atrações serão postadas nas redes sociais (@festivaldedancadelondrina).